Autopédia Quando o frio aperta os carros elétricos até tremem. Saiba porquê

Elétricos

Quando o frio aperta os carros elétricos até tremem. Saiba porquê

As baterias dos carros elétricos são particularmente afetadas pelo frio, resultando em autonomias mais baixas e consumos muito mais altos.

Teste Inverno - Kia Niro
© Mirva Kakko / Tekniikan Maailma

Com o inverno vêm as temperaturas mais baixas e isso é um desafio para os automóveis elétricos. A sua autonomia diminui consideravelmente e os seus consumos sobem de igual forma. Isso acontece, sobretudo, por dois motivos.

Um deles não é muito diferente do que também acontece com os automóveis equipados com motor de combustão e está relacionado com a utilização mais intensa dos sistemas de aquecimento. Afinal, todos eles necessitam de energia para o seu funcionamento.

Além deste motivo, há um outro que afeta ainda mais a autonomia dos automóveis elétricos e que nos fazem desejar ter tomado mais atenção nas aulas de física e química. E tem a ver tudo com a forma como funcionam as baterias.

Teste Inverno - Hyundai IONIQ 5
© Mirva Kakko / Tekniikan Maailma

A bateria converte energia química (através de reações) em energia elétrica, sendo constituída por dois elétrodos, o ânodo (polo positivo) e o cátodo (polo negativo); e por um meio onde os iões (átomos ou moléculas que perderam ou ganharam eletrões) podem-se deslocar, o eletrólito.

No caso das baterias de iões de lítio, que são as mais comuns entre os automóveis elétricos atuais, este eletrólito é líquido — o próximo passo na evolução das baterias é torná-lo sólido ou semisólido.

Para uma transferência ótima dos iões pelo eletrólito, as baterias, tal como nós, são fãs de temperaturas moderadas, neste caso, entre os 15 ºC e os 35 ºC. Podem, no entanto, operar fora deste intervalo, indo de uns gelados -20 ºC até uns tórridos 60 ºC.

No entanto, quando as temperaturas são muito baixas, acontecem naturalmente certos fenómenos que afetam a eficiência do seu funcionamento. Com o frio, as moléculas movem-se mais lentamente (menor energia cinética), reduzindo as colisões entre estas, o que por sua vez provoca um menor número de reações químicas necessárias à produção de eletricidade.

Além disso, como referimos acima, o eletrólito é líquido, mas em temperaturas muito baixas a viscosidade do líquido aumenta, o que dificulta ainda mais a transferência de iões entre os elétrodos, reduzindo ainda mais a ocorrência de reações químicas.

Tudo isto traduz-se, na prática, numa perda de eficiência, com a bateria a necessitar de usar mais energia para fornecer a mesma quantidade de potência e, por isso, há um impacto na autonomia do automóvel elétrico, que é mais reduzida.

Qual o impacto do frio na autonomia?

Se em países como Portugal, o inverno está longe de ser o mais rigoroso — as diferenças de desempenho existem, mas em menor escala —, no norte da Europa, onde as temperaturas negativas são muito mais frequentes, o impacto é muito maior. Estas condições extremas são a realidade diária de muitos condutores.

Teste Inverno - Renault Mégane E-Tech
© Mirva Kakko / Tekniikan Maailma

A publicação finlandesa Tekniikan Maailma — Mundo da Tecnologia, se fizermos uma tradução à letra —, efetua um exigente teste anual aos carros elétricos que vão chegando ao mercado.

Num desses testes, levaram oito modelos até ao norte da Finlândia, às regiões de Saariselkä (a 250 km do círculo polar ártico) e Sodankyla, com o termómetro a marcar valores entre os -8,5 ºC e os -12,5 ºC. Temperaturas que estão muito longe das consideradas ideais para o funcionamento ótimo das baterias.

Todos os modelos começaram com a bateria com 100% de carga e todos efetuaram o mesmo percurso e em condições de utilização o mais aproximadas possível do «mundo real». Os resultados não se fizeram esperar.

A perda de autonomia cifrou-se entre os 35% e os 48%, dependendo do modelo, em relação aos valores oficiais.

Ou seja, nos modelos com baterias mais pequenas (entre 60 kWh e 70 kWh), a autonomia viu-se reduzida para os 250-260 km em contraste com os cerca de 400 km ou mais oficiais.

Consequentemente o consumo de energia aumentou substancialmente. Em ciclo combinado WLTP, este grupo de modelos declara entre 14,8 kWh/100 km e os 18,4 kWh/100 km. Durante este teste em temperaturas negativas, o consumo disparou para valores entre os 25,4 kWh/100 km e os 26,9 kWh/100 km.

Teste Inverno - BMW i4
© Mirva Kakko / Tekniikan Maailma

Além do consumo de energia mais elevado e da autonomia reduzida, os automóveis elétricos têm ainda outro desafio a ultrapassar quando as temperaturas são muito baixas: o carregamento.

Tudo o que foi referido sobre a perda de eficiência da bateria aplica-se ao carregamento. Ao haver menos reações químicas, logo a bateria também vai precisar de mais tempo para absorver uma mesma quantidade de energia quando está a ser carregada. A resistência interna da bateria aumenta e por isso também perde mais energia na forma de calor.

Além disso, como a viscosidade do eletrólito é maior, a corrente de carga tem de ser menor para evitar danificar a bateria.