Autopédia Baterias de estado sólido. Como funcionam e quais as vantagens?

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Baterias de estado sólido. Como funcionam e quais as vantagens?

As baterias de estado sólido têm sido apontadas como o futuro dos automóveis elétricos, mas quando é que esse futuro chegará?

Células de baterias de estado sólido da SolidPower
© SolidPower

As baterias de estado sólido são, muito provavelmente, a maior promessa da indústria automóvel dos últimos 10 anos. E seguramente uma das maiores promessas para os anos vindouros.

Stellantis, Toyota, BMW, Nissan, BYD, Hyundai — a lista podia continuar… —, têm investido centenas de milhões de euros no seu desenvolvimento pela tentação do que prometem: baterias que não viciam, que duram mais tempo e que permitem cumprir maiores distâncias entre cargas.

Parece que acabámos de descrever o carro elétrico de sonho, não é? Mas há um «pequeno» problema. As previsões mais otimistas apontam apenas para o final desta década a chegada da tecnologia das baterias de estado sólido aos modelos de volume.

O que são baterias de estado sólido?

Antes de nos focarmos nas vantagens e problemas desta tecnologia — ou se preferirem, nos desafios —, vale a pena explicar no que consiste e em como se diferencia da tecnologia das baterias de iões de lítio, sejam estas do tipo LFP (fosfato de ferro-lítio) ou NMC/NMA (níquel, manganês, cobalto ou alumínio).

As baterias de estado sólido, tal como as de iões de lítio, têm um ânodo, um cátodo e um eletrólito. O eletrólito é o meio onde ocorre o fluxo de iões entre o ânodo e o cátodo (os elétrodos) da bateria, transferindo cargas elétricas e gerando corrente elétrica. É o eletrólito que permite a conversão de energia química em energia elétrica.

Infografia a mostrar diferenças entre baterias de iões de lítio e estado sólido
© BMW Diferenças entre a bateria de iões de lítio e a bateria de estado sólido.

A grande diferença entre as duas baterias reside precisamente no eletrólito que é sólido nas baterias de estado sólido e é líquido (ou em gel de polímero) nas baterias de iões de lítio atuais.

Para estes eletrólitos sólidos são propostos materiais como os compostos cerâmicos (óxidos, sulfetos, fosfatos), polímeros condutores e vidro.

Os eletrólitos sólidos não são uma novidade, pois foram descobertos no séc. XIX. Na altura, porém, foram descartados por terem uma densidade energética baixa, algo que já não acontece hoje. Mas foi preciso esperar mais de um século — já no nosso séc. XXI —, para voltarem a receber a atenção devida, sobretudo no contexto dos automóveis elétricos.

Apesar de estarem a alguns anos de distância de equiparem automóveis elétricos produzidos em massa, as baterias de estado sólido já são usadas hoje, aparecendo em identificadores por radio frequência (RFID) ou tecnologia wearable e em pilhas pequenas, do tipo das usadas em relógios.

Falta agora dar o salto para as quatro rodas que requer baterias bem maiores, o que traz novos desafios.

Vantagens das baterias de estado sólido

Exploremos agora as vantagens das baterias de estado sólido face às de iões de lítio.

Pessoa a segurar duas células de baterias de estado sólido
© SolidPower Células individuais de uma bateria de estado sólido da SolidPower. A empresa tem parcerias com a BMW e a Ford, que serão as primeiras a receber as suas baterias.

Maior Densidade Energética. As baterias de estado sólido têm potencial para oferecer maior densidade energética (Wh/kg) porque o eletrólito sólido é mais compacto. Isto significa que as baterias de estado sólido podem armazenar mais energia no mesmo espaço — entre duas vezes a 10 vezes mais —, comparativamente às baterias de iões de lítio.

Maior Segurança. Ao ter um eletrólito sólido, elimina-se o risco de fuga de líquido — por exemplo, em caso de acidente —, o que reduz significativamente o risco de incêndio.

Vida útil maior. As baterias em estado sólido também prometem uma vida útil maior em comparação com as baterias de iões de lítio. Devido à sua maior estabilidade química são menos suscetíveis à degradação causada pelos ciclos de carga e descarga.

Carregamentos mais rápidos. Esta estabilidade química superior permite outra vantagem importante: tempos de carregamento mais rápidos. A gestão térmica da bateria também é mais simples — não requer tantos sistemas de monitorização e controlo da bateria —, aumentando também a sua eficiência.

O grande problema desta tecnologia

Apesar das vantagens que acabámos de enumerar, a tecnologia de baterias de estado sólido ainda não passou da «teoria» à «prática». Que é como quem diz: ainda não está disponível nos carros elétricos à venda no mercado. Esta tecnologia terá de enfrentar vários desafios antes de começar a ser comercializada em larga escala.

celula individual de bateria de estado sólido da QuantumScape
© QuantumScape Célula individual de uma bateria de estado sólido da QuantumScape. O Grupo Volkswagen é o maior acionista da empresa.

Custos. Como seria de esperar o maior problema desta tecnologia atualmente é o seu custo. E podemos separar o custo adicional em duas partes: matérias-primas e construção.

No primeiro caso, as baterias de estado sólido usam ânodos de alta densidade e o lítio tem sido o material preferido para os fazer. Estas baterias precisam, assim, de mais lítio que as de iões de lítio e isso é um problema. O preço do lítio só tem tendência a subir — procura cresce mais depressa que a oferta —, e a chegada das baterias de estado sólido podem exacerbar essa tendência.

Para dificultar tudo isto, o processo de fabrico é totalmente distinto do das baterias de iões de lítio existentes. Ou seja, vão ser precisas novas fábricas e processos para garantir os benefícios das economias de escala que as de iões de lítio começam a ter.

Embora já várias marcas tenham mostrado protótipos de baterias de estado sólido, ainda nenhuma conseguiu passar a «prova» da produção em larga escala.

Degradação rápida. Não nos estamos a contradizer. Anteriormente dissemos que as baterias de estado sólido têm o potencial de durarem mais que as de iões de lítio, mas ao usarem ânodos de alumínio, partilham com estas um problema: formação de dendrites.

Dendrites são filamentos de lítio que se podem formar com o carregamento ou descarregamento rápido das baterias. Têm sido uma das causas para os curtos-circuitos internos e até explosões das baterias de iões de lítio.

Como a maioria das baterias de estado sólido conhecidas recorrem a ânodos de lítio, a formação de dendrites é uma forte possibilidade, podendo quebrar o eletrólito sólido e fazer curto-circuito. A solução passa por usar outro material para o ânodo, ou então livrar-se do ânodo, como promete a QuantumScape:

Quando chegam?

Apesar dos desafios, estes não são inultrapassáveis; veja-se a evolução que vimos nas baterias de iões de lítio no espaço de uma década. O potencial das baterias de estado sólido é enorme e são muitos os que olham para esta tecnologia como o futuro dos carros 100% elétricos.

Mas é um futuro que só deverá passar a ser realidade no final desta década, altura em que marcas como a Toyota, Nissan ou BMW ponderam lançar os primeiros modelos com esta tecnologia.

Numa altura em que a química das baterias conhece novas evoluções todos os anos, será que as baterias em estado sólido vão mesmo mesmo materializar-se ou vão «evaporar» como uma promessa nunca cumprida? A resposta a esta questão chega nos próximos anos.