Autopédia Esqueçam os motores elétricos porque a Ferrari tem uma nova tecnologia

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Esqueçam os motores elétricos porque a Ferrari tem uma nova tecnologia

A Ferrari continua a investir nos motores de combustão. Por momentos vamos esquecer os motores elétricos e falar de combustão, combinado?

patente ferrari motor contrario
© Ferrari

Conhecem a expressão “virar o bico ao prego”? Foi mais ou menos isso que engenheiros da Ferrari acabaram de patentear. Uma maneira de contornar as limitações aerodinâmicas devido ao posicionamento dos motores de combustão.

Como? Virando-o literalmente ao contrário. Ou se preferirem continuar nas frases populares: virando o motor de «pernas para o ar». Como é óbvio, não foi assim tão simples…

Conceptualmente, virar um motor de «pernas para o ar» exige mais do que força de braços — não é disso que estamos a falar. Exige engenharia de ponta. Afinal de contas, os motores de combustão são feitos (mais ou menos) da mesma forma há mais de um século por algum motivo.

Por isso vamos deixar as frases populares de lado e explicar os detalhes e as eventuais vantagens desta nova tecnologia, cuja patente foi registada há poucos dias. Para quem gosta de engenharia pura e dura está aqui a ligação para esse registo.

Afinal, qual era o problema?

Não há apenas um problema, há vários problemas. Até parece que estou a falar de uma relação amorosa, mas é mais ou menos isso que acontece na prática. Nos corredores da Ferrari há uma relação de «amor ódio» com as metas de emissões.

Por um lado é preciso baixar as emissões drasticamente e, por outro, há um desejo ardente de continuar a desenvolver tecnologias para evitar que o grito das nobres mecânicas italianas se cale para sempre.

Além disso, é preciso continuar a mostrar que os motores de combustão podem oferecer mais vantagens do que os motores elétricos.

São muitos desafios ao mesmo tempo. Ou seja, o velho motor de combustão precisa de aprender novos truques. Como é que se faz isso? Desafiando uma equipa de engenheiros altamente motivada e atirando-lhes recursos para cima. Dois condimentos que seguramente não faltam em Maranello.

A solução da Ferrari

Olhando para o registo de patente da Ferrari ficamos de queixo caído. A quantidade de inovações descritas na patente quase dava um livro. Mas vamos focar-nos no essencial.

Na prática, este registo de patente propõe um superdesportivo com motor de combustão em posição central traseira e com um motor elétrico no eixo dianteiro. Sobre o motor elétrico há pouca informação, mas sobre o motor de combustão acontece precisamente o contrário. É sobre esse que vamos falar nas próximas linhas.

Trata-se de um motor de combustão, sobrealimentado, com uma invulgar — para a Ferrari — arquitetura de seis cilindros em linha. Até aqui, nada de novo. Mas depois olhamos para os detalhes e vemos que está tudo de «pernas para o ar»: a cambota na parte superior e a cabeça do motor na parte inferior (ver imagem em destaque).

Messerschmitt BF 109E
Revisitando os livros de história encontramos outros exemplos de motores invertidos. Nomeadamente na aviação, durante a Segunda Guerra. Na imagem: Messerschmitt BF 109E.

Na Ferrari, esta decisão teve dois objetivos práticos. O primeiro de todos foi retirar a máxima eficiência do combustível proposto para este motor: hidrogénio. O comportamento deste combustível na câmara de combustão é totalmente diferente da gasolina e por isso permite abordagens novas.

Em segundo lugar, colocando a parte mais volumosa do motor na parte superior (leia-se, o bloco do motor) aumenta-se o espaço disponível para posicionar a transmissão, nomeadamente numa posição menos recuada.

Patente de motor Ferrari em posição invertida
© Ferrari Com a transmissão mais próxima do centro do carro é possível ganhar espaço para soluções aerodinâmicas mais agressivas. Nomeadamente um difusor traseiro mais eficaz, capaz de gerar mais carga aerodinâmica (vulgo downforce).

Parece fácil, mas não é

O problema desta solução «invertida» é que coloca outros desafios aos engenheiros da marca. Nomeadamente na sobrealimentação do motor de combustão.

É certo que este motor terá sobrealimentação: mas a Ferrari apresentou três formas de o fazer.

Patente de motor Ferrari
© Ferrari Neste motor, a Ferrari tentará aproveitar todas as formas de energia excepto o calor.

A primeira é através de turbos elétricos. Ou seja, em vez de termos apenas um reaproveitamento dos gases de escape para comprimir o ar para a admissão, esta função é delegada a um motor elétrico associado a uma turbina que comprime o ar. De onde vem essa energia? Da regeneração de energia em travagem do motor elétrico dianteiro.

A outra solução reposiciona os turbos, mas mantém o acionamento da sobrealimentação a partir de motores elétricos.

Patente de motor ferrari: turbocompressores
© Ferrari

A terceira via é talvez a mais interessante. Falamos de um sistema do tipo MGU-H, em tudo igual ao que encontramos na Fórmula 1.

Aí o que acontece é que temos um turbo ligado a um gerador elétrico para converter a energia cinética dos gases de escape em energia elétrica.

Patente de motor ferrari: sistema tipo MGU-H
© Ferrari O que acontece depois a esse energia é uma questão de gestão: pode ir para um motor elétrico auxiliar ou para os já mencionados turbos elétricos.

Depois de tudo isto, existe também a questão do arrefecimento do motor e da lubrificação dos componentes. Naturalmente, a Ferrari pensou em tudo isto e também no acesso mecânico a estes componentes.

Este motor vai ver a luz do dia?

A verdade é que não sabemos. Mas não deixa de ser revigorante ver que o velhinho motor de combustão ainda tem alguns truques na manga, mesmo que, neste caso, como vimos, já necessite do «Viagra» da eletrificação.