O primeiro final de tarde de verão deste ano (NDR: à data da publicação original deste artigo), efetivamente digno desse nome, reservou-me uma boa surpresa: um encontro no trânsito com um Peugeot 106 Rallye em estado impecável — o que é raro, diga-se. Foi pena que o Thom ou o Maccario (os fotógrafos) não estivessem com a máquina fotográfica em riste…
Vi esse tal Peugeot 106 Rallye e bateram-me as saudades dos anos 90 e dos seus carros minimalistas — mais «puros», dirão alguns. Foram tantas as saudades que decidi dedicar-lhe algumas linhas…
VEJAM TAMBÉM: Glórias do Passado. Citroën AX GT/GTI: A derradeira «escola de condução»(…) mecânica voluntarista, baixo peso, diversão garantida. Sem compromissos!

O Peugeot 106 foi um modelo muito bem nascido. Esteticamente bem conseguido e mecanicamente fiável em todas as suas versões, fez a delícia de milhares de jovens (e não só…) durante muitos anos e ainda mais quilómetros. Tinha duas versões desportivas: o XSI e o Rallye — mais tarde, na fase II do modelo, chegaria a versão GTI de 120 cv.
O 106 Rallye recorria a um pequeno bloco de quatro cilindros com 1.3 l (TU2) que debitava 100 cv a umas estridentes 7200 rpm. O 106 XSI ficava-se pela mesma potência (desceria para 95 cv na versão com catalisador), mas recorria a um bloco de 1.4 l. Motor que seria descontinuado em 1994, surgindo no seu lugar, ainda durante a Fase I, um bloco de 1.6 l e 103 cv.
Mas isso foi, sobretudo, lá fora, porque em Portugal — e em exclusivo —, foi comercializado durante 1995 e 1996 um XSI com o mesmo motor 1.3 do 106 Rallye. O XSI 1.6 simplesmente pagava demasiado IA (Imposto Automóvel) devido à sua cilindrada, levando a um preço proibitivo, terminando rapidamente a sua carreira por cá. Portugal tornou-se assim, no único país, a ter 106 XSI com o motor do 106 Rallye.

O uso do 1.3 no 106 Rallye também permitia que fosse homologado para competição na então muito popular categoria sub-1300, levando também ao caráter distinto dos dois pocket rockets.
Enquanto o XSI era indicado para aqueles que queriam um desportivo full-extras, o Rallye não. O Rallye era um desportivo para quem queria verdadeiramente um desportivo: mecânica voluntarista, baixo peso, diversão garantida. Sem compromissos!

Aspeto a condizer
Por fora, o aspeto era mesmo de um carro de ralis. Apontamentos com as cores do departamento desportivo da marca, jantes em aço com um design soberbo — a recuperar o mesmo desenho das do 205 Rallye —, e mais alguns detalhes que faziam a diferença.
VEJAM TAMBÉM: O Último dos… GTI na PeugeotO 106 Rallye só estava disponível em vermelho, branco ou preto. Por dentro, estava totalmente despido de equipamento. Não contava com vidros elétricos, direção assistida, enfim… nada! Tudo para tornar o modelo o mais leve possível. O chão forrado a vermelho conferia aquele toque final de “por favor abusa de mim na próxima curva”.

Com todas estas qualidades, os portugueses renderam-se à simplicidade e performance do Peugeot 106 Rallye. O carro fazia furor nas revistas da especialidade e na rua arrancava suspiros aos jovens lobos que ambicionavam comprar o primeiro desportivo.
Na verdade, a performance não era avassaladora, 0-100 km/h em 10,3s, e a velocidade de ponta de 190 km/h não era surpreendente — apesar de ter amigos que juram a pés juntos terem atingido os 200 km/h num Rallye. Vamos acreditar que sim (e sim, estão todos vivos e de boa saúde).
O ambiente natural do 106 Rallye era mesmo as estradas reviradas, quanto mais reviradas melhor. Era inevitável, os sorrisos rasgados sucediam-se aos comandos de uma carro talhado para ser conduzido com a faca-nos-dentes.
Franco e previsível, assentava como uma luva nas mãos dos jovens aspirantes a pilotos do dia a dia, e era capaz até de surpreender os mais veteranos graças ao chassi impecavelmente afinado.

O sucesso foi tanto que a Peugeot preparou para o mercado português e francês uma versão especial limitada a 50 unidades, conhecida por R2. Esta versão tinha muito material vindo diretamente da divisão de competição Peugeot-Talbot: suspensões mais desportivas, travões mais potentes, jantes de 14″ da marca Speedline, cintos de competição, assim como um escape diferente e alterações no mapeamento da centralina que aumentava a potência para os 106 cv.
“Daquela época, conduzi praticamente todos os desportivos — e sobrevivi! Ficou a faltar-me o Peugeot 106 Rallye”
Fase II
Depois da primeira fase de comercialização da gama 106, em 1996 surgia a atualização do modelo (Fase II ou no original, Phase 2), onde as maiores diferenças estavam dianteira e traseira reestilizadas.

O 106 Rallye regressava, mas agora o topo de gama era ocupado pelo mais potente GTI, que equipava um motor de 1.6 l, 16 válvulas e 120 cv — o mesmo motor que viria a equipar o Citroën Saxo Cup.
O novo 106 Rallye vendeu-se entre 1997 a 1998, e tal como antes, era o mais espartano da gama. O motor 1.3 (TU2) teve de ir para a reforma e entrou em cena o maior bloco de 1.6 l de oito válvulas (o mesmo que chegou a equipar o XSI) que debitava 103 cv de potência a umas mais pacíficas 6200 rpm — menos 1000 rpm que antes —, mas também com mais binário.

Acelerava de 0 a 100 km/h em 9,6s e atingia uma velocidade máxima de 195 km/h. Apesar das melhorias no Rallye Phase2 — performance, disponibilidade e até trocou os travões atrás de tambor por uns de disco —, o 106 Rallye Phase 1 continuou a ser o mais amado dos dois pelo seu caráter.
Na altura, confesso que a minha preferência ia para o irmão Citroën AX Sport, e mais tarde para o Citroën Saxo Cup.
VEJAM TAMBÉM: A história do Volkswagen Polo G40. A mais de 200 km/h durante 24 horasDebati-me várias vezes por eles em conversas de amigos, contra os defensores dos 106 Rallye, XSI e GTI, do Polo G40 e dos Swift GTI, entre outros — acho que naquela altura nós ligávamos mais aos carros do que a rapaziada de agora. Mas hoje, prestes a ultrapassar a barreira dos 30, confesso que sempre achei o 106 Rallye mais bonito. Pronto, já disse.
Daquela época, conduzi praticamente todos os desportivos — e sobrevivi! Ficou a faltar-me o Peugeot 106 Rallye, mas ainda não perdi a esperança. Se o senhor que passou num Peugeot 106 Rallye na 2.ª Circular por volta das 19h00 de terça-feira (dia 2 de Julho) estiver a ler este texto, contacte-me. Vamos lá dar uma volta nisso…
Atualização a 27 de dezembro de 2021: foram corrigidas algumas imprecisões históricas relativas ao 106 XSI.
Sobre o “Glórias do Passado.”. É a rubrica da Razão Automóvel dedicada a modelos e versões que de alguma forma se destacaram. Gostamos de recordar as máquinas que outrora nos fizeram sonhar. Embarca connosco nesta viagem no tempo aqui na Razão Automóvel.
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