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Autoeuropa tem uma enorme vantagem que fica em Espanha

De Espanha nem bom vento nem bom casamento? É uma expressão que poderemos ter de rever. É em Espanha que reside um dos trunfos da Autoeuropa.

© VW Autoeuropa

Neste momento, no «chão de fábrica» da Autoeuropa — expressão que descreve o quotidiano de uma unidade de produção —, funcionários e responsáveis pela operação da maior fábrica de automóveis do país estão a ultimar os preparativos para iniciar a produção da segunda geração do Volkswagen T-Roc.

As primeiras 50 unidades de pré-produção do novo T-Roc já estão prontas. Segundo fonte da Razão Automóvel, esta primeira remessa de modelos 100% funcionais já está a caminho da Alemanha para “avaliações e testes finais”.

É um momento especialmente importante. Não só para a fábrica de Palmela, mas também para o PIB português (mais concretamente para 1,4% do PIB português). Em causa está a sucessão do terceiro carro mais vendido da Europa em 2023. Números particularmente surpreendentes tendo em consideração que falamos de um modelo em fim de vida.

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© Razão Automóvel Segunda geração do Volkswagen T-Roc já está em testes dinâmicos.

Mas este não é o único desafio que a Autoeuropa enfrenta. Há outro projeto a caminho e Espanha pode dar uma ajuda importante.

Uma fábrica, duas corridas

Enquanto nas linhas de produção há uma corrida contra o tempo para iniciar a produção do T-Roc — que deverá ter início no primeiro trimestre de 2025, na administração da fábrica de Palmela há outra corrida a decorrer: ganhar a produção do elétrico mais barato da Volkswagen. Estes processos decorrem internamente e colocam as fábricas do grupo a competirem entre si.

Este modelo deverá situar-se abaixo do Volkswagen ID.2 e que deverá custar menos de 20 mil euros. Em termos de oferta de espaço, este modelo deverá oferecer quotas de habitabilidade próximas do atual Volkswagen Polo. Será que também vai adotar este nome? Ainda não está decidido.

Não seria a primeira vez que um modelo do segmento dos utilitários é produzido em Portugal. Recuando a um passado ainda recente, a fábrica de Mangualde era uma das unidades onde eram produzidos modelos como o Citroën AX e, mais tarde, o sucessor Saxo.

Uma vantagem em Espanha

Importa recordar que a Autoeuropa é considerada uma fábrica muito competitiva dentro do Grupo Volkswagen — em 2023 essa eficiência até garantiu um prémio internacional. A fábrica portuguesa não está na mesma situação de outras unidades, como a fábrica da Audi, na Bélgica, onde é produzido o Q8 e-tron, que será encerrada em fevereiro de 2025.

Mas para além dos méritos da própria Autoeuropa há outros ventos favoráveis a soprarem para os lados de Palmela. Tratando-se de um modelo 100% elétrico, o facto de ser em Espanha que estão localizadas duas importantes fábricas de baterias da Volkswagen, nomeadamente em Martorell (Catalunha) e Sagunto (Valência) é um importante trunfo.

Mas é a fábrica de Sagunto que interessa à Autoeuropa neste cenário. As baterias produzidas aqui também podem servir o futuro elétrico barato da Volkswagen, dando à fábrica portuguesa uma vantagem geográfica, com pontos a favor na logística.

É mais barato transportar baterias de Valência para Palmela, do que para Poznan (Polónia) ou Mladá Boleslav (República Checa), as duas outras fábricas do Grupo Volkswagen na corrida.

teaser Volkswagen elétrico por menos de 20 mil euros
© Volkswagen A Volkswagen até agora só revelou este teaser do seu futuro elétrico mais barato.

Ainda a favor da Autoeuropa, temos de olhar, mais uma vez, para Espanha. O Grupo Volkswagen está a investir 10 mil milhões de euros no país vizinho para o transformar num importante centro de mobilidade elétrica. A liderar esta transformação está um homem: Markus Haupt, vice-presidente de Produção e Logística da SEAT S.A.

Mais um trunfo espanhol com sotaque alemão

Pois bem, Markus Haupt não é apenas o homem do leme na eletrificação do Grupo Volkwagen. É também um profundo conhecedor da realidade industrial do gigante alemão. Markus Haupt está no Grupo Volkswagen há mais de 20 anos, e tem um conhecimento profundo e direto do que é a Autoeuropa.

Foi ele o gestor do projeto do T-Roc. Melhor que ninguém conhece as competências e qualidades da maior fábrica de automóveis de Portugal. Para além de que optar pela Autoeuropa poderá gerar mais sinergias e ser a opção mais eficiente, tendo em conta que está em causa a produção mais um modelo elétrico na Península Ibérica.

Neste jogo de vantagens e desvantagens é importante não descurar outro fator: a intervenção do Governo português. Seja por intermédio de benefícios fiscais, seja por apoio nos investimentos necessários, as políticas do Governo português podem ser um fator decisivo na decisão final do destino de produção deste modelo.

Veja-se o exemplo de Espanha, cujas decisões políticas encaminharam uma parte substancial do PRR para a transformação e eletrificação da indústria automóvel espanhola.

Ou recorde-se mesmo o exemplo da própria Autoeuropa, que na década de 90 teve nos fundos para a formação profissional e nas políticas desenvolvidas em parceria com o Instituto do Emprego e Formação Profissional, uma importante vantagem competitiva. Uma realidade muito bem retratada neste estudo, da autoria do Professor António Damasceno Correia.

A Volkswagen Sharan, juntamente com a Ford Galaxy foram os primeiros modelos a serem produzidos na Autoeuropa.

Posto isto, há vários vetores a concorrerem para que o destino final da produção do elétrico mais barato da Volkswagen seja Portugal. Até os ventos vindos de Espanha são favoráveis — o que historicamente falando nem sempre acontece.

No chão de fábrica, os trabalhadores da Autoeuropa também estão a fazer a sua parte. Agora é esperar que o Governo português, com o recato que estes assuntos exigem, também esteja a fazer a sua parte.

Depois do arranque da produção do T-Roc, talvez a conquista de mais um modelo para Palmela seja uma das notícias que o setor mais precisa.