Notícias “Vamos continuar a fazer automóveis” afirma Wayne Griffiths, CEO da SEAT

Entrevista

“Vamos continuar a fazer automóveis” afirma Wayne Griffiths, CEO da SEAT

Entrevistámos Wayne Griffiths, CEO da SEAT & CUPRA. Mais do que uma conversa sobre as marcas que lidera, foi um diagnóstico à saúde do mercado automóvel europeu.

Wayne Griffiths, CEO da SEAT & CUPRA
© SEAT & CUPRA

Wayne Griffiths, diretor-executivo da SEAT & CUPRA, vive entre dois estados de alma: a satisfação de ter conseguido os melhores resultados financeiros da história da SEAT e a preocupação de estar a estabelecer um polo de produção de carros elétricos e correr o risco de não ter clientes a quem os vender.

Mas não é tudo, há muito mais a acontecer nos bastidores de um dos maiores motores da economia espanhola. Há cerca de dois anos surgiram rumores de que a SEAT iria começar a reduzir a sua gama, até à sua inevitável «extinção». No entanto, em conversa com Griffiths, percebemos que talvez a narrativa não tenha sido bem contada.

Nesta entrevista abordámos esse assunto de frente e Wayne Griffiths respondeu com a mesma frontalidade. Tivemos ainda a oportunidade de conversar com o «homem forte» da SEAT e da CUPRA sobre a entrada da marca de Barcelona no mercado norte-americano, e sobre as suas preocupações relativas ao clima europeu face à imposição provisória de tarifas aos veículos elétricos importados da China.

SEAT & CUPRA modelos
© SEAT & CUPRA Esta entrevista é também um diagnóstico à saúde do setor automóvel na Europa. Os seus desafios, vantagens e ameaças.

Há um ano, disse que o objetivo de meio milhão de vendas estava no seu horizonte de médio prazo. Qual é a atualização desta declaração nos dias de hoje? 2027?

Wayne Griffiths (WG): Sempre dissemos que chegaríamos a meio milhão de carros vendidos por ano quando a gama CUPRA estivesse completa com os cinco modelos: o Tavascan, o Raval, o Terramar —estes três ainda por comercializar —, o Born e o Formentor.

Uma vez que o Raval será o último a chegar em 2026, pode dizer-se que sim, que o plano para os 500 mil carros se deverá concretizar em 2027. No entanto, o nosso objetivo primordial não é o volume, mas sim o lucro. 400, 500, 600, 700 mil… veremos. Não é fulcral. Ainda que vender muitos carros seja um ponto importante para ter sucesso comercial e financeiro.

A margem de lucro (34% superior) dos automóveis CUPRA versus os SEAT foi um fator decisivo para o alcance dos melhores resultados financeiros de sempre?

WG: Sem dúvida. Os modelos CUPRA têm margens de lucro mais robustas, tanto que já representam mais de metade da nossa faturação — ainda que correspondam a menos de metade do volume de veículos vendidos.

Mas esse resultado histórico aconteceu também porque conseguimos reduzir os custos fixos da empresa em 30% e, ao fazê-lo, o ponto de equilíbrio também baixou consideravelmente. Com tudo isto, a nossa empresa tornou-se mais saudável e robusta o que é muito importante tendo em conta que estamos a passar pela maior disrupção que esta indústria já viveu, o que obriga a enormes investimentos.

Fim da linha para a SEAT

Em 2023, foi passada a mensagem de que se iria começar a eliminar gradualmente a gama de automóveis da SEAT, mas ultimamente têm surgido vários sinais de que isso não irá acontecer tão depressa. O que é que isto significa?

WG: Na verdade, essa mensagem pode ter sido mal compreendida e depois acabou por entrar num efeito de bola de neve que cresceu sem parar. Nunca esteve nos nossos planos acabar com os automóveis com motor de combustão da marca SEAT, que irá continuar, pelo menos, até 2035.

Desta forma, teremos as duas marcas e as duas tecnologias de propulsão, ainda mais considerando que a adoção da propulsão elétrica não está a ser tão rápida como muitos visionários acharam que ia ser.

“A CUPRA precisa da SEAT e a SEAT precisa da CUPRA.”

Wayne Griffiths, CEO da SEAT & CUPRA

Se a SEAT continuar a vender automóveis até 2035 fará sentido investir em novos modelos ou é possível chegar até lá com os atuais através de atualizações?

WG: Penso que a SEAT tem uma gama de produtos suficientemente forte, especialmente com os motores híbridos plug-in. Adoraria eletrificar a SEAT amanhã, mas todas as empresas têm de ter as suas prioridades bem definidas e essa não é a nossa. A prioridade é eletrificar a empresa, mas com a CUPRA, que é a marca que nos permite fazê-lo.

Europa vs China

Qual a sua opinião sobre as tarifas que a UE está a impor aos elétricos importados da China?

WG: É preocupante quando a solução que os legisladores encontram para tentar ser tão competitivo como os concorrentes é tomar medidas protecionistas e criar impostos. E é isso que a Europa está a fazer, em vez de tentar perceber o que é que permitiu aos fabricantes domésticos dos Estados Unidos da América (EUA) e da China chegar a essa posição de vantagem competitiva.

Wayne Griffiths, CEO da SEAT & CUPRA
© SEAT & CUPRA Wayne Griffiths, CEO da SEAT & CUPRA com protótipo Darkrebel

A União Europeia até pode tentar comprar algum tempo com essas tarifas aplicadas aos elétricos importados da China, mas não vai resolver o problema. A solução de longo prazo é aumentar a competitividade da indústria automóvel europeia, incentivar o consumo, ampliar a infraestrutura, fomentar a produção de automóveis elétricos com políticas de energia que tornem a eletricidade mais acessível.

No caso do Tavascan, não pudemos cooperar nas investigações da Comissão Europeia sobre as políticas de concorrência leal porque ainda não estávamos a fabricar o Tavascan na China e a importá-lo.

Por isso, foi imposta a tarifa máxima (37,6% a somar aos 10% que já eram impostos). Mas o expectável é que essa taxa desça (para 20,8%), tendo em conta a total cooperação que a nossa empresa deu às investigações da Comissão Europeia (além da origem das peças e a própria estrutura/origem da empresa fundamentalmente europeia). Seja como for, vai prejudicar as vendas, claro.

CUPRA Formentor, perfil
© CUPRA CUPRA Formentor recebeu este ano um «lavar de cara».

Quando o Raval foi revelado, o seu preço indicativo estava entre os 27 mil euros e os 30 mil euros. Porém, nos últimos 12 meses, as coisas mudaram, nomeadamente no que diz respeito à ofensiva de modelos elétricos chineses, o que levou a alguns ajustes no planeamento dos produtos e no posicionamento dos preços das marcas ocidentais…

WG: O mercado está muito competitivo. Os governos nos EUA e na China apoiam muito mais a sua indústria do que os legisladores europeus e é por isso que eles conseguem ter preços mais agressivos do que os nossos. Essa é uma das razões que levou à criação das tarifas de importação que estão a ser aplicadas aos automóveis fabricados na China.

A minha preocupação principal, no entanto, resulta do facto de não existir a procura que tínhamos previsto quando fizemos o plano de negócio do Raval… Muitas vezes ouvia a questão “não estão atrasados com a vossa gama de carros elétricos?” Eu sempre disse que não e a verdade é que hoje a pergunta se pode formular ao contrário: “será que não estamos adiantados?”.

CUPRA UrbanRebel, frente 3/4
© CUPRA CUPRA UrbanRebel antecipa o futuro Raval de produção

Estamos a terminar a fábrica de baterias aqui em Martorell para os carros elétricos, estamos a deslocar a produção do Ibiza e do Arona para criar espaço para o nosso elétrico compacto no ano que vem e depois olho para o mercado espanhol e vejo que a quota de elétricos é de apenas 5%… 95% dos carros que se vendem aqui têm motor de combustão.

E isso é um drama tendo em conta que daqui a uns meses metade da produção na fábrica de Martorell será de carros elétricos…

“Temos aqui um desequilíbrio que, em grande medida, resulta da inexistência de políticas na Europa para se chegar aos objetivos irracionais que foram traçados. É fácil traçar objetivos, mas mais difícil tomar medidas para que os mesmos sejam possíveis.”

Wayne Griffiths, CEO da SEAT & CUPRA

Os mercados europeus onde os elétricos têm maior penetração e onde se vendem em grandes volumes serão suficientes para absorver o impacto do hub de produção de carros elétricos e baterias que a SEAT S.A, está a instalar em Espanha?

WG: Terão de ser e não apenas pela nossa empresa, mas também para que os objetivos da Comissão Europeia da redução de emissões até 2035 sejam exequíveis.

A questão é que estamos num ponto da subida muito mais recuado do que deveríamos de estar para chegar a esse objetivo dentro de 11 anos.

“Não há plano B para nós… ou até há, é o Plano A, porque os investimentos estão feitos, a rota está traçada, já que nesta indústria as decisões tomadas são de longo prazo.”

Wayne Griffiths, CEO da SEAT & CUPRA

Como está a evoluir a negociação com o Grupo Volkswagen para levar para Barcelona a produção de veículos com a futura plataforma SSP?

WG: Temos um plano para o elétrico compacto e urbano que tem a sua própria plataforma (MEB Entry) e esse projeto irá preencher boa parte da capacidade de produção até ao final desta década com os modelos Leon, Ibiza, Formentor, Arona e o elétrico urbano. Essas conversações já visam o período pós-2030 quando, sim, iremos precisar de uma segunda plataforma para automóveis elétricos, pelo que ainda estão longe de estar concluídas.

CUPRA na América do Norte

A entrada da CUPRA no mercado americano até ao final da década parece ser uma jogada ousada. Terá um novo modelo de distribuição, sem aproveitar a rede de concessionários Volkwagen ou Audi?

WG: Nós vamos associar-nos a um forte parceiro local porque julgo que tentar fazê-lo sozinhos seria muito ingénuo. Mas devemos tentar criar um novo modelo de distribuição com esse parceiro. Para além de que, quando entrarmos, vamos ter de ser capazes de ter o negócio totalmente a funcionar no primeiro dia, ou então teremos ainda mais dificuldades.

Que apelo poderá ter uma nova marca «tribal» de automóveis com imagem desportiva para o cliente americano?

WG: O design é um dos elementos diferenciadores da CUPRA e aquele que queremos potenciar. Também a propulsão totalmente elétrica terá de ser valorizada. Iremos estar especialmente focados em estados que sabemos que são mais sensíveis a estes valores, como a costa Oeste e a costa Leste e sul e não tanto o interior profundo do Texas.

Voltando a Espanha, é um dos mercados europeus mais atrasados na eletrificação. Já desistiu de tentar mobilizar o Governo espanhol ou é para continuar?

WG: Estive dois anos e meio a pressionar para que o governo espanhol tomasse medidas para acelerar a transição para a mobilidade elétrica, nomeadamente em termos de infraestrutura, até ao momento em que me cansei, muito sinceramente.

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Proibir e penalizar os carros com motor de combustão qualquer um pode fazer, mas é amplamente insuficiente. E dececionante até. Sem incentivos não me parece — como estamos todos a ver — que funcione. Não é física quântica, é bastante claro e simples na verdade.

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