Notícias Esta empresa recebeu milhões para teleconduzir carros. CEO explica tecnologia

Web Summit 2024

Esta empresa recebeu milhões para teleconduzir carros. CEO explica tecnologia

E se em vez de condução autónoma a próxima revolução na mobilidade passar por carros teleconduzidos? Tecnologia já está a ser usada nos EUA.

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© Razão Automóvel

A condução autónoma e a inteligência artificial têm dominado muitos dos painéis da Web Summit 2024, mas ainda há quem imagine uma revolução no conceito de mobilidade que mantém as pessoas no centro de toda ação.

É o caso da Vay, uma startup sediada em Berlim que aposta num serviço de mobilidade com carros teleconduzidos. Os primeiros carros com esta tecnologia já estão na estrada e já completaram mais de 5000 viagens em Las Vegas, nos EUA.

Para explicar os contornos desta sua visão, Thomas von der Ohe, co-fundador e diretor executivo da Vay, passou por Lisboa e pela Web Summit 2024, onde dividiu o palco com Diogo Teixeira, publisher da Razão Automóvel, sempre orientados pelo tema “The software powering driverless tech & autonomous cars“. Sigam esta ligação para ver ou rever esta conferência.

O que diferencia a Vay?

Ao contrário de empresas como a Uber ou a Waymo, a proposta da Vay não assenta num serviço de car sharing tradicional ou em nenhum tipo de conceito de robô-táxi. Como Thomas von der Ohe fez questão de sublinhar por diversas ocasiões, a Vay “não é um serviço de condução autónoma, mas sim um serviço de condução remota”.

Tudo começa com um simples clique na aplicação da Vay, para chamar um carro, que chega até ao utilizador sem ninguém atrás do volante, uma vez que está a ser controlado à distância por um operador. Depois de estabelecer contacto por voz, o operador passa o controlo da viatura ao utilizador e é o cliente que assume na íntegra a condução do carro.

Uma vez no destino, o operador volta a assumir o controlo do carro e segue em direção ao próximo pedido. Ou então, caso seja necessário, pode ir estacionar o carro por si.

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© Vay O controlo do automóvel nunca sai do domínio humano.

“Isto permite criar aquela que é, por uma longa margem, a forma de transporte porta a porta mais acessível”, começou por dizer o diretor executivo da Vay, antes de destacar:

Pensamos nisto como a nova geração do car renting e do car sharing, onde não é preciso caminhar até ao carro nem estacioná-lo, porque tudo isso é feito por um condutor remoto.

Uma tecnologia que… existe

Quando se fala tanto em condução autónoma, parece algo conservador olhar para o condutor como parte integrante de uma solução que promete mudar o conceito de mobilidade individual. Mas há um bom motivo para isso:

“Passei seis anos na Bay Area, em São Francisco, a desenvolver robô-táxis, numa das empresas líderes do segmento, a Zoox. E o que senti é que estávamos sempre a três anos de distância”, confessou Thomas von der Ohe.

“Quando a Google (agora a Waymo) começou, dizia que em 2016 ou 2017 íamos ter carros autónomos. Quando me juntei à Zoox, dizia-se que em 2019 ou 2020 eles estariam por todo lado em São Francisco. E recentemente tivemos o Elon Musk a dizer (que o Cybercab) que ía ser realidade, basicamente, dentro de três anos, em 2026 ou 2027”, acrescentou, antes de dizer:

Parece que faltam sempre três anos (para a condução autónoma) e a razão para isso é porque é bastante difícil. Do ponto de vista tecnológico é altamente subestimado o quão difícil é.

“Foi por isso que dissemos: vamos fazer algo completamente diferente. Não estamos em competição com os robô-táxi, estamos a fazer car sharing sem condutores dentro do carro. E está a funcionar hoje”, explicou von der Ohe, que não tem dúvidas acerca do caminho que a sua empresa tem vindo a trilhar:

Vejo um mundo onde todos os veículos poderão ser conduzidos remotamente.

Porquê Las Vegas?

A Vay é, nesta fase, a única empresa autorizada a fazer testes sem condutor dentro do carro na Europa. A startup, que já recebeu cerca de 130 milhões de euros, está autorizada a testar a tecnologia numa região de Hamburgo, no norte da Alemanha, mas ainda não pode operar sem limitações, como está a fazer em Las Vegas, nos Estados Unidos.

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© Vay A Vay tem atualmente 16 carros a operar em Las Vegas. Mas a frota vai crescer nos próximos meses.

A culpa, como explicou von der Ohe durante a sua passagem pelo palco SaaS da Web Summit 2024, é da legislação europeia: “Infelizmente tivemos alguns desafios do ponto de vista da legislação”.

O desafio na Europa é que o calendário de regulamentação é feito passo a passo. Não podemos oferecer o serviço em escala, estamos sempre dependentes dos reguladores, que estão em vários departamentos, com motivações muito distintas.

“Decidimos, enquanto empresa, continuar na Europa, mas ter a nossa operação comercial em Las Vegas. Lá temos total aprovação regulamentar para oferecer os nossos serviços sem limitações em termos de número de veículos ou da área onde podemos operar”, atirou.

Europa está muito atrás da China e dos EUA

Apesar das questões regulamentares, von der Ohe recusa olhar para isso como uma desculpa para a Europa estar a perder a corrida à condução autónoma. E garante que isso pode vir a ser um grande erro:

Temos que encarar o facto de que estamos muito atrasados, no que toca a condução autónoma, face aos Estados Unidos e à China. E quando digo «atrasados», é mesmo muitos anos atrás.

“Não estou a falar dos sistemas de assistência avançada ao condutor (ADAS), de Nível 2 ou mesmo Nível 3. Estou a falar de robô-táxis de Nível 4. Estamos mesmo muito atrasados e um dos maiores erros é dizermos que é por culpa das legislação: não é esse o caso”, atirou.

Vay Teledrive
© Vay A Vay tem atualmente parcerias com a Kia e com a Peugeot.

Quanto à condução autónoma total, de Nível 5, von der Ohe acredita que há ainda um longo caminho a percorrer e que essa é uma realidade longínqua: “Nível 5 de condução autónoma? Não sei… diria que está a 20 ou 30 anos de distância”, disse.

Também por isso, o co-fundador da Vay não tem dúvidas de que a próxima revolução no transporte público individual será feita com os carros teleconduzidos, um serviço que diz ter vantagens claras nos custos e nos argumentos para convencer os legisladores.

Isto porque neste serviço, o controlo efetivo do automóvel está sempre no domínio humano: “Se é um humano a tomar a decisão, esta pessoa pode tomar decisões com base em coisas que já viu antes. Isso dá mais confiança aos reguladores, mas também potencialmente a pessoas que estejam sentadas nos carros”, explicou Thomas von der Ohe.

E o preço?

Quanto ao preço, tudo começa no custo da própria tecnologia: “É um sistema baseado em câmeras, por isso é relativamente acessível. Podemos inclusive usar câmeras que até já podem estar no próprio carro ou, no futuro, em camiões e carrinhas”, reiterou.

Vay Teledrive Las Vegas
© Vay A Vay já realizou mais de 5000 viagens em Las Vegas, sem qualquer tipo de incidente.

Mas o fator mais importante, e que faz com que a Vay afirme que oferece um serviço “pela metade do preço da Uber”, é que os telecondutores apenas conduzem durante breves momentos e podem alternar de carro em carro.

“A beleza da condução remota é que podemos teletransportar humanos para qualquer tipo de veículos. Levamos o carro e estacionamo-lo. No meio, que é a maioria do tempo, é o utilizador que conduz. Isto permite que tenhamos um rácio de um condutor para 10 veículos, em vez de um para um, como na Uber”, explicou.