Opinião Uma lição muito importante para o novo Governo

Mobilidade

Uma lição muito importante para o novo Governo

Os portugueses toleram quase tudo, menos que ataquem o automóvel. Foi assim em 2023 com o IUC e em 1994 com o «buzinão» na Ponte 25 de Abril.

manifestação stop IUC
© Razão Automóvel

A quantidade de eventos políticos que sucederam no país, após manifestações contra o novo IUC, pode dar a falsa sensação que já passou muito tempo. Mas, na verdade, passaram apenas cinco meses desde o momento em que milhares de portugueses saíram à rua, de norte a sul do país, em protesto.

Estávamos a 5 de novembro de 2023. É um momento que deve permanecer bem presente na agenda de todos os partidos e, em particular, na agenda do novo Governo.

É que os portugueses suportam quase tudo, menos que lhes toquem num dos seus bens mais importantes: o automóvel.

A importância do automóvel

Há uma característica que deve atribuir especial relevância política e social à manifestação contra o novo IUC: foi espontânea. Não teve nos seus bastidores a articulação de sindicatos, partidos políticos ou de outras forças igualmente importantes em democracia.

manifestação novo IUC
© Razão Automóvel

Convém recordar que, dos diversos assuntos que dominavam a atualidade (a falta de médicos, a crise nas urgências, a falta de professores, a habitação, etc…), o IUC foi o único capaz de mobilizar milhares de portugueses. Isto, apesar de nem ser a medida mais onerosa que estava inscrita no OE 2024.

Não era a mais onerosa, mas tinha um significado mais profundo: era um ataque direto a uma ferramenta de trabalho. Para milhões de portugueses o automóvel é isso mesmo. Não é um capricho nem um luxo. É uma ferramenta de trabalho.

É essa realidade que muitos políticos tendem a esquecer, embrenhados em ataques ao automóvel, ignorando ciclovias vazias e ferrovias em greve. Quando se ataca o automóvel, é isso que está em causa: o ganha-pão de muitas famílias portuguesas.

As lições do IUC

Olhando em retrospetiva, esta mobilização nacional não devia surpreender. Não foi a primeira vez. No dia 24 de junho deste ano assinalam-se os 30 anos do «buzinão» na Ponte 25 de Abril. Uma manifestação que também começou de forma espontânea e que terminou da forma que todos sabemos: com o fim do Governo liderado por Aníbal Cavaco Silva.

manifestação novo IUC
© Razão Automóvel

É importante retirar as devidas lições destes eventos e recordar que a poluição dos carros não pode ignorar a “pobreza de mobilidade”, um conceito que a Autoridade da Mobilidade e Transportes introduziu recentemente no estudo “Obrigações de Serviço Público – Verdes”.

Sem mencionar diretamente o Imposto Único de Circulação (IUC), este relatório menciona que “na aplicação de taxação mais penalizadora a veículos mais poluentes, deverá ser acautelada uma discriminação positiva dos cidadãos com rendimentos mais baixos e residentes em zonas de baixa densidade, com menor oferta de transporte público e onde não existam infraestruturas facilitadoras”, entenda-se, redes de carregamento elétrico ou locais de abastecimento.

Acho que esse caminho está a ser trilhado e que o discurso público, de parte a parte, está menos radicalizado. E há indicadores positivos. Como ministra do Ambiente e Energia vamos ter Maria da Graça Carvalho, ex-deputada europeia, uma escolha que mereceu, inclusivamente, elogios de João Galamba, ex-ministro das Infraestruturas de António Costa.

As posições da agora ministra do Ambiente e Energia sobre mobilidade e transição energética, no que diz respeito ao automóvel, são públicas. Agora, é esperar que o novo Governo, liderado por Luís Montenegro, esteja à altura das circunstâncias e não esqueça as lições do passado.