Penso no Renault Mégane RS 275 Trophy e as minhas mãos começam automaticamente a suar. Tanto assim é que recordo as sensações vividas aos seus comandos e começo a duvidar que consiga arranjar adjetivos suficientes para o caraterizar. Neste apelo à memória juro que até os dedos resvalam no teclado.
“God gave me an okay mind, but an ass which can feel everything in the car”. Pois bem, no RS Trophy o meu traseiro fartou-se de conduzir.”

Assim, assumindo logo à partida a minha dificuldade em exprimir por palavras as sensações vividas ao volante do Mégane RS Trophy, lembrei-me da Ode Triunfal de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa. O “tal” que vivia a apoteose das máquinas através da escrita. Porque o meu génio nem sequer o é, lembrei-me das palavras de quem o foi para vos transmitir as sensações deste Trophy:
“Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!”
Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)
Sem saber, Álvaro de Campos resumiu na Ode Triunfal as sensações de êxtase que podemos vivenciar aos comandos do Renault Mégane RS Trophy.
Se o tivesse efetivamente conduzido, Álvaro de Campos diria que a linha de escape Akrapovič (exclusiva desta versão Trophy) faz toda a diferença. Os rateres emitidos pela linha de escape da marca eslovena são audíveis a quarteirões de distância e são uma constante. A estacionar? Pááááa. A levar o puto à escola? Pááááá. Com a “faca-nos-dentes” numa estrada secundária? VRUUUM-PÁ-PÁ-PÁ-PÁÁÁÁÁÁ – Caps Lock com fartura para aumentar o efeito dramático.
Se o Mégane RS com o “escape normal” já matava pássaros e assustava padres e golfinhos, com este escape nem quero imaginar. Em boa verdade, tentei nem saber. Evitei ao máximo circular por estradas onde já tinha antecedentes, não fosse alguém denunciar-me às autoridades por atentado à ordem pública, “olha o tipo do carro amarelo, apanhem-no!”. Além do mais dizem que a internet nas cadeias não é a melhor. Preferi não arriscar, a Razão Automóvel agradece.
Por seu turno a suspensão Öhlins (também exclusiva desta versão) contribui para o incremento de perfomance em curva do Trophy. A velocidade com que abordamos as curvas no RS 275 Trophy pode até ser igual à do RS “normal” mas as sensações são diferentes – o tira teimas teria de ser com um ao lado do outro.
Onde a suspensão escandinava ganha efetivamente às suspensões da versão “normal” é na consistência de funcionamento, não cede nunca mantendo a postura mesmo depois de 20 km em modo full attack. Ganha também no feedback proporcionado, principalmente na frente. Se a leitura da estrada no RS já era referencial, no RS Trophy chega a ser desconcertante.
No filme Rush, a personagem que encarna Niki Lauda dizia o seguinte “God gave me an okay mind, but an ass which can feel everything in the car”. Pois bem, no RS Trophy o meu traseiro fartou-se de conduzir. Se tiverem uma hérnia discal melhor; se não tiverem descansem porque é uma questão de tempo.
A estabilidade em linha reta também melhorou substancialmente – recordo que circular a direito acima dos 140km/h no RS “normal” chegava a ser um desafio. Com as suspensões Öhlins é tudo mais calmo, a dianteira “fareja” menos a estrada.
Resumindo e baralhando, com as suspensões Öhlins podemos até nem ir mais depressa mas vamos mais confiantes. E como sabem, ter confiança é meio caminho andado para «rapar» aquelas centésimas de segundo por volta que separam os homens de barba rija dos aspirantes a condutores.
Para fechar este capítulo, falta referir que estas suspensões Öhlins derivam do mundo dos ralis e que são muito idênticas às que equipam o Mégane R.S. N4 – a versão de competição do carro francês. Acreditem, este é um dado muito importante. Principalmente numa conversa entre amigos. Nada bate o “ah e tal, o meu carro tem suspensões de rali”. Eu sei porque fartei-me de esfregar isso na cara dos meus amigos… perdi uns quantos mas valeu a pena.
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Falando do motor, os engenheiros procuraram aumentar o pico de binário para as 5.550 rpm, através dos parâmetros da gestão electrónica. E, ao aumentarem o binário nesse regime para 349 Nm (+10 Nm), aumentaram a potência para 275cv (201 kW). Contudo, o binário máximo de 360 Nm, disponível entre as 3.000 e as 5.000 rpm, mantém-se inalterado. Sublinho que os parâmetros máximos de potência e binário só estão disponíveis através da selecção dos modos Sport ou Race, no sistema de condução dinâmica R.S. Drive.
Nota-se que este motor é uma unidade de outros tempos. A potência por litro não é nada por aí além, os consumos são pornográficos e existe um hiato considerável entre a resposta do motor e o toque no acelerador (turbo-lag). Mas tem pedigree, tem raça e anda… oh se anda! Portanto, como dizem os brasileiros vou deixar-me de “frescuras”.
Até porque o Renault Mégane RS Trophy não é um carro de frescuras. Tirem-lhe as forras do interior, os bancos traseiros, montem um roll-bar e num ápice têm um carro de rali na garagem para levar o puto à escola se for preciso. É essa a magia do Renault Mégane RS 275 Trophy.
É claro que para a magia acontecer têm de desaparecer pelo menos 44 150 euros da vossa conta bancária. Depois da compra, os truques de magia continuam lá para os lados do depósito com a gasolina a desaparecer à velocidade da luz, nem o famoso Luís de Matos fazia melhor. A marca diz que o consumo é de apenas 7.5 l/100 km em ciclo misto – eu até acredito que seja verdade, mas deve ter sido com um monge budista ao volante. Comigo, em modo Zen nunca baixou dos 9 l/100 km.
Falta referir que a versão RS Trophy tem pormenores em camurça no interior (volante, alavanca das mudanças e travão-de-mão), uns autocolantes de gosto duvidoso nas laterais e um lábio no pára-choques dianteiro a dizer Trophy. As jantes negras que podem admirar nas fotografias são fornecidas pela Speedline. Se gostam desses pormenores, podem ver aqui o catálogo da marca.
Antes de terminar, apenas uma palavra de agradecimento aos meus vizinhos por nunca terem chamado as autoridades. Fico a dever-vos essa.
Fotografia: Thom V. Esveld
MOTOR | 4 Cilindros |
CILINDRADA | 1998 cc |
TRANSMISSÃO | Manual 6 Vel. |
TRAÇÃO | Dianteira |
PESO | 1374 kg. |
POTÊNCIA | 275 CV / 5500 rpm |
BINÁRIO | 360 NM / 3000 rpm |
0-100 KM/H | 6,0 seg |
VEL. MÁXIMA | 255 km/h |
CONSUMO (ciclo misto) | 7.5 lt./ 100 km (valores da marca) |
PREÇO | 44.150 € (valor base) |
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Renault Mégane RS 275 Trophy: Ode Triunfal
Se o vosso sonho é ir para o trabalho todos os dias num carro de ralis, o Renault Mégane RS 275 Trophy é a escolha certa. Um modelo que transporta a magia da competição para a vossa garagem.
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