Testes Barcelona-Lisboa no elétrico CUPRA Tavascan. Quanto custou?

Análise

Barcelona-Lisboa no elétrico CUPRA Tavascan. Quanto custou?

Ir de Barcelona até Lisboa num elétrico como o CUPRA Tavascan permitiu perceber que ainda há um longo caminho até uma mobilidade maioritariamente elétrica.

CUPRA Tavascan na estrada, perfil
© CUPRA

Este teste que fizemos ao novo CUPRA Tavascan não é muito habitual, para mais num elétrico: afinal, foram percorridos praticamente 1300 km entre Barcelona e Lisboa.

Fomos buscá-lo diretamente ao porto de Barcelona, depois de ter estado sete semanas em viagem por mar desde o porto de Xangai, China. É o primeiro CUPRA a ser fabricado nesse país.

O percurso longo deu para conhecer a fundo o Tavascan, pelo que o convidamos a ler ou reler esse teste à nova proposta 100% elétrica da CUPRA:

Se no teste publicado ficámos a conhecer o carro, este artigo será dedicado à viagem em si, num elétrico, entre Barcelona e Lisboa — com passagens por Saragoça, Madrid, Mérida e Estremoz.

Mais especificamente, nos gastos que a viagem implicou, sejam eles monetários ou no tempo perdido a carregar a bateria de 77 kWh (capacidade útil) do Tavascan, para atravessar a Península Ibérica. Será que é prático fazê-lo com um elétrico? Quais são os desafios?

Partida

Antes de partirmos, conheçamos melhor o carro. O Tavascan é o primeiro «SUV-Coupé» 100% elétrico da marca espanhola e a unidade que testámos é o Tavascan VZ, o mais potente de todos. Tem dois motores (um em cada eixo), que juntos, entregam um total de 250 kW (340 cv).

Entrega da chave do CUPRA Tavascan ao Joaquim Oliveira no Porto de Barcelona
© Razão Automóvel Encontro marcado numa manhã no porto de Barcelona, horas após a chegada do cargueiro oriundo da China.

Já referi a bateria de 77 kWh (líquidos), com a CUPRA a anunciar 16,5 kWh/100 km de consumo combinado (WLTP) e uma autonomia de 522 km. A dura realidade diz-me que é mais realista pensar em 450 km com uma carga completa da bateria, após olhar para os 21 kWh/100 km com que me foi entregue no início desta viagem.

Assim, na mais utópica das hipóteses, seriam necessárias três paragens nesta viagem para cargas completas. No entanto, acabei por fazer mais — seis no total — para uma gestão mais racional da energia e das necessidades do corpo humano. Isto obriga a um planeamento adicional de modo a que eu, o condutor, e o carro possam carregar baterias em simultâneo, seja durante uma noite de sono reparador ou numa refeição mais demorada.

Depois das fotografias da praxe, dei início a esta viagem para o centro de Barcelona, fazendo alguns quilómetros urbanos, para que nem tudo seja autoestrada e estradas nacionais. Algumas horas depois — só para fazer 20 km —, seguimos por estradas nacionais, aos pés da serra de Montserrat, apontando o Tavascan em direção a Saragoça (onde passei a primeira noite), cerca de 300 km a oeste de Barcelona, pela autoestrada APII.

O navegador estava programado para Madrid e o software indicava duas paragens necessárias, uma na autoestrada antes de Saragoça e outra já mais próxima da capital espanhola.

CUPRA Tavascan em Montjuic em Barcelona
© Razão Automóvel Barcelona ao fundo.

O condutor não tem que se preocupar em procurar os postos de carregamento porque o software sugere os pontos de paragem para recarga e indica qual será o SoC (estado da carga na bateria) na chegada, hora prevista de chegada, tempo de carregamento e hora de saída, sempre tendo em conta a potência de cada ponto de carga.

A disponibilidade dos postos é indicada e em tempo real, para evitar dissabores como tempos de espera enquanto outro veículo termina a sua carga, avarias e afins. Além disso, os utilizadores registados podem ainda avaliar os postos de carregamento, com base nas suas experiências.

Falta de postos de carregamento

O maior problema das viagens longas com veículos elétricos por Espanha é outro. O drama é a capilaridade (ou falta dela…) da rede de postos de carregamento e também os problemas frequentes dos que já existem.

Foi o caso de uma estação de carregamento rápido (180 kW) de Monegros Este (antes de Saragoça), que decidi visitar para perceber qual seria a avaria que o mesmo tinha — o ecrã central do Tavascan mostrava o carregador a vermelho.

À chegada comprovo que, realmente, nenhum dos postos nesta área de serviço está operacional, mesmo não se tratando de uma “avaria”, como o software descrevia. Simplesmente ainda não estavam ativos. Mesmo não sendo uma informação 100% correta, o mais importante é que estava registado como indisponível, evitando induzir o condutor em erro e criar ansiedade de autonomia (ou, no limite, deixá-lo «pendurado»).

Nesse posto (explorado pela Galp) uma funcionária deixou-me um aviso: “na autoestrada APII antes de Saragoça, não há postos de carregamento”. Tinha razão. Foi necessário sair para estradas secundárias e procurar por um posto nos pueblos nas margens daquela via rápida.

CUPRA Tavascan a carregar em posto GALP
© Razão Automóvel Este posto na Área de Serviço Monegros Este é novo, mas não está ligado à rede.

Quarenta quilómetros depois, o merecido descanso já em Saragoça, onde condutor e o Tavascan iriam pernoitar num hotel, equipado com um carregador de corrente alternada (AC) de 11 kW. Oito ou nove horas são suficientes para voltar a ter 100% da carga às ordens.

Os elétricos promovem boas maneiras

Pouco depois das 9h00 da manhã seguinte, eu e o Tavascan estávamos com as pilhas recarregadas para a segunda etapa da viagem, necessariamente mais exigente em termos de consumo, já que seria totalmente feita por autoestrada.

CUPRA Tavascan no hotel em Zaragoza a carregar
© Razão Automóvel No hotel, em Saragoça, acordei com o “depósito atestado” depois de uma merecida noite de sono. Conveniente? Sem dúvida.

O meu parceiro de viagem, o software, indicava que conseguia chegar a Madrid (com 460 km de autonomia “no depósito” para uma distância de 340 km entre as duas cidades), mas como vi que existia um posto da IONITY (a rede europeia de carregamentos ultrarrápidos) não resisti a parar para dar um fôlego rápido à bateria.

Isto porque encontrar um posto IONITY em Espanha é como tropeçar num oásis no deserto. O melhor é mesmo parar. Algo que me foi confirmado por um outro condutor de um elétrico que estava a dar vida à bateria do seu Ford Mustang Mach-E, na estação de Ariza: “este é o único posto IONITY entre Saragoça e Madrid e é por isso que venho aqui sempre”, explicou algo resignado, enquanto criávamos uma ligação típica de condutores de elétricos enquanto esperam pelo carregamento do seu carro.

É uma empatia parecida com a que se gera entre membros de clubes e que deverá ser totalmente desconhecida, por quem viaja em automóveis com motores de combustão. Qualquer paragem de cinco minutos numa estação de serviço é suficiente para seguir viagem sem qualquer contacto amistoso e nem sequer um simples “bom dia” ou “boa tarde” com quem por ali enche o depósito.

Hala Madrid

O tempo estimado de chegada a Madrid indicava 13h00 e a chuva que acabou por cair, quase que arruinava a oportunidade de fotografar o Tavascan à frente do novo estádio Santiago Bernabéu. Mas ainda tive oportunidade de um segundo registo fotográfico diante da Plaza Cibeles.

Próximo destino rumo à Estremadura. Quer dizer que a primeira metade da viagem estava completa, mas para que não houvesse qualquer percalço, o navegador e software do Tavascan recomendavam uma paragem pouco depois da capital espanhola.

O posto da Wenea tinha uma potência de 180 kW (praticamente metade dos 350 kW dos IONITY), mas não deixava de ser um dos mais potentes por aquelas bandas. Juntou-se “a fome à vontade de comer”: o condutor almoçou e o CUPRA Tavascan também: no primeiro caso um bitoque, no segundo 62 kWh de eletricidade «fresquinha».

Continuando a seguir as fiáveis recomendações do software do Tavascan, efetuei uma nova paragem de 27 minutos para retemperar forças, na zona de Cazalegas/Toledo. Foram apenas 14 kWh desta vez, repondo a carga de 79% para 97%, que é como quem diz, elevando a autonomia de 300 km para 374 km.

Chegámos a Mérida, capital da Estremadura e uma cidade romana que merece muito mais do que uma visita rápida.

Antes de mostrar estes dois ex-libris (Acueducto de los milagros, Puente romano) da povoação ao CUPRA, mantive-o em carga noutro posto IONITY.

Aproveitei para colocar os emails em dia durante 44 minutos, que serviram para elevar a carga de 22% a 95% (62 kWh). Pelas minhas contas deveriam dar para 350 km de autoestrada neste último pit stop antes de entrar em Portugal.

Menos touros, mais postos de carregamento… e portagens

O que se nota logo ao entrar em Portugal é que a infraestrutura de carregamento está mais desenvolvida, mesmo nas estações convencionais: os sinais de aproximação de uma área de serviço indicam, mais frequentemente, que há postos de carregamento, o que não existe em Espanha. Se nuestros hermanos colocassem uns postos de carregamento debaixo de cada tourito negro gigante que adorna as autoestradas, o caso mudaria logo de figura…

Figura de touro à beira da estrada
© Razão Automóvel Há mais touros destes nas autoestradas espanholas do que postos de carregamento? Talvez.

Portugal tem uma densidade superior de postos de carregamento (também temos um território cinco vezes mais pequeno), especialmente nos de potência média e alta e na capilaridade em vias rápidas. Os governos portugueses têm investido mais na infraestrutura de carregamento que os espanhóis e isso reflete-se também na quota de mercado dos elétricos: cerca de 15% em Portugal contra apenas cerca de 5% em Espanha.

Uma atenuante para Espanha prende-se com a decisão de uma empresa privada: a rede Supercharger da Tesla está aberta a veículos de outras marcas, o que não acontece em Portugal.

As lacunas na infraestrutura agravam-se sobremaneira em datas festivas e períodos de férias, nos quais os utilizadores são obrigados a estar horas em filas para conseguirem carregar os seus carros. Mais uma vez demonstra-se que a infraestrutura de carregamento ainda tem um longo caminho a percorrer, mais em Espanha do que em Portugal, mas é um problema real e que persiste nos dois países.

Carreguei pela última vez antes de chegar a Lisboa, já deste lado da fronteira, em Estremoz, na área de serviço na autoestrada onde há um posto da IONITY. Mas só depois de uma obrigatória excursão ao Castelo de Estremoz para mais um conjunto de «monumentais» fotografias.

© Razão Automóvel No Castelo de Estremoz.

Daí para a frente, nos cerca de 175 km até à capital portuguesa, a única diferença foi a necessidade de pagar portagens de autoestrada (o que não tinha acontecido nos anteriores mais de 1000 km…).

Os números que importa reter

No final do trajeto o odómetro do CUPRA Tavascan acumulava 1280 km e uma média de 23 kWh/100 km. Os consumos oscilaram, no geral, entre os 20 kWh/100 km em cidade e os 25 kWh/100 km em autoestrada, a velocidades mais «soltas».

O que fica acima dos valores oficiais de 16,5 kWh/100 km. Expectável, tendo em conta que 90% do trajeto foi em autoestrada, inimiga da autonomia dos carros elétricos. Como consequência, neste tipo de trajetos e no «mundo real» devemos pensar em 400 km por carga completa e não 500 km. É possível aproximarmo-nos da fasquia mais alta, quanto mais tempo e distância fizermos em cidade.

O desempenho do CUPRA Tavascan nos carregamentos foi mais positivo, ainda que as potências que suporta sejam modestas: 11 kW em corrente alternada (AC) e 135 kW em corrente contínua (DC).

Mapa com trajeto efetuado e paragens para carregamento do CUPRA Tavascan
© Razão Automóvel Carregamentos efetuados: 1 — Saragoça (hotel); 2 — Ariza (autoestrada, posto IONITY); 3 — Madrid (Wenea); 4 — Toledo (autoestrada, posto IONITY); 5 — Merida (autoestrada, posto IONITY); 6 — Estremoz (autoestrada, posto IONITY)

Além disso, estes são valores de pico, pois podem variar bastante, sobretudo em DC, dependendo do estado de carga da bateria: abaixo dos 20% e acima dos 80% a velocidade será inferior. Mesmo em AC variam.

Por exemplo, no hotel em Saragoça, com a bateria a 5%, o carregamento AC (até 11 kW) começou a 9 kW, mas baixou para 6 kW quando a bateria estava quase cheia.

Dito isto, os carregamentos em DC foram positivos. A CUPRA assegurou-me que foi feito um trabalho intenso para permitir que a potência de pico de 135 kW se mantinha o maior tempo possível: só precisa de 29 minutos para ir dos 10% aos 80%, que é apenas um minuto mais que o Born VZ (79 kWh) que tem 185 kW (+50 kW) de potência de carregamento.

Barcelona-Lisboa. Quanto custou a viagem?

Finalmente, na questão dos custos, o CUPRA Tavascan VZ teve gastos mais elevados do que seria expectável. Isto devido aos carregamentos feitos nos postos ultrarrápidos da IONITY, nos quais o custo do kWh é muito mais elevado, até três vezes mais do que em carregamentos domésticos.

Só que para cobrir longas distâncias em autoestrada foi o recurso que tive à disposição, mesmo não sendo o mais indicado para o carro em questão — 135 kW de potência máxima de carregamento. Pode ver as contas dos carregamentos efetuados.

LocalFornecedor /
Potência
Tempo
Carga
kWhSoC /
Auton. à chegada
SoC /
Auton. à saída
Custo
Hotel Saragoça,
Saragoça
— /
11 kW (AC)
9h15min755% /
15 km
100% /
435 km
22,02 €
Autovia NII, Km 197,1,
Ariza
Ionity /
350 kW
31min2666% /
260 km
96% /
402 km
16,62 €
Av. Madrid,
28600 Madrid,
Navalcarnero (A5)
Wenea /
100 kW
60min6222% /
98 km
100% /
399 km
40,35 €
Polígono Sector III,
45683,
Toledo (A5)
Ionity /
350 kW
25min1479% /
301 km
96% /
374 km
9,37 €
Av. Filipe VI (S/N),
Merida
Ionity /
350 kW
46min6321% /
70 km
95% /
350 km
40,91 €
Estremoz (AE)Ionity /
350 kW
19min2951% /
166 km
84% /
279 km
20,01 €
Total249149,28 €
SoC (State of Charge): estado da carga da bateria

Nestas contas falta adicionar os 46 kWh com que o CUPRA Tavascan me foi entregue. Assim, para um trajeto de 1280 km, desde o coração da Catalunha até Lisboa, o CUPRA Tavascan VZ gastou 295 kWh de energia elétrica.

Os custos acumulados de carregamento (que incluem taxas e impostos), entre os postos ultrarrápidos predominantes, postos de velocidade rápida e um em corrente alternada foram de 149,28 euros. O que dá um custo médio de 0,60 €/kW.

Se adicionarmos os tais 46 kWh com que vinha inicialmente, o valor estimado é de 13,80 euros, o que somados dá um total de 163,08 euros (baixando o custo médio para 0,55 €/kWh).

CUPRA Tavascan em Lisboa, com Padrão dos Descobrimentos ao fundo
© Razão Automóvel Viagem concluída.

Seria possível ter custos mais reduzidos? Claro que sim. Mas temos de ter em conta a limitação nas autoestradas espanholas aos postos IONITY. Em Portugal é mais fácil encontrar alternativas.

Isto significa que a vantagem económica do CUPRA Tavascan fica muito diminuída em relação a um SUV Diesel de dimensões similares e com tração às quatro rodas (segmento D ou segmento C grande).

Considerando um consumo médio de 8 l/100 km na mesma viagem para um SUV Diesel 4×4, os custos de combustível seriam de 179,2 euros (considerando os preços do gasóleo em Espanha e Portugal).

Pode ficar mais barato

A vantagem económica do CUPRA Tavascan seria muito maior se tivesse subscrito os planos mensais de assinatura com os fornecedores, que baixam em muito os custos com energia. Em Espanha (grande parte da viagem foi lá), na IONITY, por 11,99 €/mês, o custo passa a ser de 0,37 €/kWh. Só isso reduziria a fatura final desta viagem de Barcelona a Lisboa para 109 euros. Em Portugal, a IONITY tem um plano de subscrição similar.